A aquisição de componentes personalizados (ou customizados) no cenário industrial brasileiro é um processo que exige alta precisão na comunicação e uma visão clara das operações dos parceiros de manufatura, especialmente em um contexto de cadeias de suprimentos cada vez mais voláteis. Nos últimos anos, o Brasil enfrentou desafios significativos, como interrupções logísticas causadas por gargalos portuários e oscilações na oferta de matérias-primas, intensificados pela pandemia e pela crescente demanda por produtos customizados. Esses fatores têm impactado diretamente empresas que adotam a manufatura just-in-time (JIT), um modelo que prioriza estoques enxutos para reduzir custos operacionais, mas que se torna vulnerável diante de imprevistos, como atrasos na entrega ou variações cambiais que encarecem insumos importados.
A manufatura JIT, amplamente utilizada por indústrias que buscam eficiência e competitividade, depende de uma sincronia impecável entre fornecedores e linhas de produção. No entanto, quando parceiros falham em entregar peças dentro dos prazos, com a qualidade esperada ou com transparência nas etapas produtivas, os impactos financeiros são imediatos e severos, afetando desde a continuidade da produção até a relação com os clientes. Um exemplo emblemático no Brasil é o setor automotivo, onde montadoras como a Volkswagen, em São Bernardo do Campo (SP), já enfrentaram paralisações devido à falta de semicondutores, evidenciando como a fragilidade da cadeia de suprimentos pode comprometer os benefícios do JIT em um mercado dinâmico e sujeito a instabilidades econômicas.
JIT Sob Pressão: Desafios para as Equipes de Compras
As equipes de compras, responsáveis por alinhar as necessidades das empresas às capacidades dos fornecedores, enfrentam uma pressão crescente para manter a eficiência em um ambiente de incertezas. O estudo “Mapeando o Futuro da Manufatura Personalizada”, conduzido pela Fast Radius com 250 profissionais do setor, destaca que quase 50% dos entrevistados abandonaram o JIT nos últimos dois anos, reflexo de desafios como prazos de entrega prolongados (42%), aumento de custos (40%) e falta de flexibilidade (35%). No Brasil, esses problemas são agravados por fatores como a infraestrutura logística limitada – com destaque para a dependência de transporte rodoviário, que responde por cerca de 65% da movimentação de cargas, segundo a CNT – e a burocracia aduaneira, que pode atrasar a liberação de componentes importados essenciais.
Apesar disso, 32% das empresas persistem no JIT, especialmente aquelas que cultivam parcerias estratégicas com fornecedores confiáveis. A Embraer, por exemplo, líder no setor aeroespacial brasileiro, mantém relações de longo prazo com fornecedores de peças customizadas para suas aeronaves, como turbinas e sistemas eletrônicos, garantindo maior previsibilidade na entrega e na qualidade. Essa abordagem, apoiada em contratos robustos e comunicação integrada, permite mitigar os riscos do JIT, mas exige investimentos em gestão de relacionamentos e em tecnologias que ofereçam rastreabilidade, como sistemas ERP (Enterprise Resource Planning) adaptados às especificidades da manufatura nacional. Assim, enquanto o modelo enfrenta pressões, soluções baseadas em confiança e inovação continuam a sustentar sua viabilidade em indústrias estratégicas.
Desafios com Fabricantes Personalizados
Além das fragilidades da cadeia de suprimentos, as interações com fabricantes personalizados no Brasil revelam barreiras operacionais que comprometem a eficiência das equipes de aquisição. A comunicação ineficaz, apontada como o principal obstáculo, gera retrabalho e erros, como especificações mal interpretadas que resultam em peças fora do padrão. O estudo da Fast Radius indica que quase metade dos entrevistados recebeu cotações rápidas imprecisas em mais de 75% dos casos, enquanto dois terços relataram prejuízos financeiros devido à baixa qualidade dos componentes entregues. A falta de transparência, com atrasos ou falhas descobertos somente após os prazos estipulados, agrava ainda mais o cenário, especialmente em um mercado onde a agilidade é um diferencial competitivo.
No setor de óleo e gás, a Petrobras enfrenta desafios semelhantes ao adquirir peças personalizadas para plataformas offshore, como válvulas e bombas de alta precisão. A dependência de fornecedores locais e internacionais muitas vezes esbarra em falhas de comunicação e na ausência de sistemas padronizados que garantam visibilidade sobre o progresso da produção. Para contornar esses problemas, a estatal tem investido em especificações técnicas rigorosas, alinhadas à NBR ISO 9001, e em auditorias regulares de fornecedores, mas os custos associados a essas medidas ainda pesam no orçamento. Esses exemplos ilustram como a falta de integração e confiabilidade nos processos de manufatura personalizada pode comprometer os resultados financeiros e operacionais, demandando soluções que transcendam as práticas tradicionais.
Manufatura em Nuvem como Solução
A manufatura em nuvem surge como uma resposta inovadora aos desafios da aquisição no Brasil, oferecendo uma infraestrutura digital que unifica o ciclo de vida da produção, desde o design até a entrega. Com plataformas baseadas em tecnologias como IoT (Internet das Coisas) e blockchain, esse modelo proporciona escalabilidade, flexibilidade e transparência, permitindo que as equipes de aquisição acompanhem em tempo real o status de pedidos, otimizem cotações e reduzam erros de comunicação. No contexto brasileiro, onde a digitalização industrial ainda avança a passos cautelosos – apenas 43% das empresas industriais utilizam soluções 4.0, segundo a CNI –, a manufatura em nuvem pode ser um catalisador para a modernização, especialmente em setores que demandam alta customização.
Um exemplo promissor é o setor de energias renováveis, onde empresas como a WEG, sediada em Jaraguá do Sul (SC), fabricam componentes para turbinas eólicas e sistemas solares. Ao adotar plataformas em nuvem, a WEG consegue integrar fornecedores de peças personalizadas, como pás e geradores, em um ecossistema digital que oferece visibilidade total sobre prazos e qualidade, reduzindo custos logísticos e acelerando o time-to-market. Essa abordagem não só alivia as pressões sobre o JIT, mas também alinha as operações às metas de sustentabilidade, um diferencial competitivo em um mercado global que valoriza eficiência e responsabilidade ambiental. Assim, a manufatura em nuvem posiciona o Brasil como um player mais resiliente e preparado para os desafios da indústria contemporânea.